O CUIDADO ESPECIAL DE DEUS PARA OS POBRES
NO VELHO TESTAMENTO
É boa nova que Deus, o Criador todo-poderoso, é o defensor dos fracos e humildes. “Pai para os órfãos e defensor das viúvas é Deus em sua santa habitação. Deus dá um lar aos solitários, liberta os presos para a prosperidade mas os rebeldes vivem em uma terra árida” (Salmo 68.5-6). O Salmo 146.9 repete esse tema: “O Senhor protege o estrangeiro e sustém o órfão e a viúva, mas frustra o propósito dos ímpios”. Ele ouviu os clamores para justiça de Abel e Nabote. Para Caim, Deus disse: “Da terra o sangue do seu irmão está clamando” (Gênesis 4.10). Séculos depois, Deus disse a Elias: “Vá encontrar-se com Acabe, o rei de Israel… Agora ele está na vinha de Nabote, para tomar posse dela. Diga-lhe que assim diz o Senhor: ´Você assassinou um homem e ainda se apossou de sua propriedade? … No local onde os cães lamberam o sangue de Nabote, lamberão também o seu sangue; isso mesmo, o seu sangue´” (1 Reis 21.18-19).
Ser rico, poderoso e favorecido e além disso ser orgulhoso é muito perigoso. Deus não tolera ninguém tomar o seu lugar de honra. Ana, a mãe de Samuel, triste e angustiada, clamou a Deus por um filho. O Senhor ouviu a sua oração e, ela em gratidão, louvou a Deus:
“O Senhor é quem dá pobreza e riqueza; ele humilha e exalta. Levanta do pó o necessitado e do monte de cinzas ergue o pobre; ele os faz sentar-se com príncipes e lhes dá lugar de honra” (1 Samuel 2.7-8).
Surpreendida pelo anúncio do anjo Gabriel de que ela seria a mãe do Filho do Altíssimo, aquele que receberia o trono do reino eterno prometido ao seu pai Davi, Maria cantou: “(Deus) Derrubou governantes dos seus tronos, mas exaltou os humildes. Encheu de coisas boas os famintos, mas despediu de mãos vazias os ricos” (Lucas 1.52-53). No final da parábola dos trabalhadores na vinha Jesus disse que “os últimos serão primeiros e os primeiros serão últimos” (Mateus 20.16). Veja também Mateus 19.30, Marcos 10.31 e Lucas 13.30. De fato, Jesus disse que aquele que quisesse ser o maior no reino deveria ser servo de todos (Marcos 9.35). Seu irmão Tiago, que se tornou um dos principais líderes da igreja de Jerusalém, escreveu:
“O irmão de condição humilde deve orgulhar-se quando estiver em elevada posição. E o rico deve orgulhar-se caso passe a viver em condição humilde, porque o rico passará como a flor do campo. Pois o sol se levanta, traz o calor e seca a planta; cai então a sua flor, e a sua beleza é destruída. Da mesma forma o rico murchará em meio aos seus afazeres” (Tiago 1.9-11).
O despojamento dos ricos e poderosos é encarado como uma grande libertação e salvação de Israel do Egito. Deus apareceu a Moisés na sarça ardente ao pé do Monte Sinai e disse: “De fato tenho visto a opressão sobre o meu povo no Egito, tenho escutado o seu clamor, por causa dos seus feitores, e sei quanto eles estão sofrendo. Por isso desci para livrá-los das mãos dos egípcios e tirá-los daqui para uma terra boa e vasta, onde manam leite e mel” (Êxodo 3.7-8). Depois que viu os poderosos milagres de Deus realizados por meio de Moisés e sofreu o empobrecimento da sua terra e a perda de seu primogênito, o Faraó finalmente estava disposto a soltar Israel da escravidão.
E Israel não saiu de mãos vazias. Deus assegurou que fossem pagos por seus anos de escravidão. Após a última praga, a morte do primogênito, os egípcios literalmente expulsaram seus escravos. Ao sair, os israelitas “pediram aos egípcios objetos de prata e de ouro, bem como roupas. O Senhor concedeu ao povo uma disposição favorável da parte dos egípcios, de modo que lhes davam o que pediam; assim eles despojaram os egípcios (Êxodo 12.35-36).
Portanto, se o Egito foi abatido e Israel foi exaltado por sua libertação pela misericórdia e poder do Senhor, ele nunca deve esquecer de Deus, e oprimir os pobres e os fracos. Se Deus se opõe aos orgulhosos, Israel nunca deve se orgulhar na prosperidade proporcionada por Deus. Esse orgulho provocaria Deus a se tornar seu inimigo para ensinar-lhe humildade.
Na legislação que deu a Israel no Monte Sinai, no deserto, através de Moisés, Deus fez providência especial para os fracos, os levitas que não tinham herança de terra, as viúvas, os órfãos e o estrangeiro que vivia no meio do povo. Deus disse: “Não maltratem nem oprimam o estrangeiro, pois vocês foram estrangeiros no Egito” (Êxodo 22.21).
“Ao final de cada três anos, tragam todos os dízimos da colheita do terceiro ano, armazenando-os em sua própria cidade, para que os levitas, que não possuem propriedade nem herança, os estrangeiros, os órfãos e as viúvas que vivem na sua cidade venham comer e saciar-se, e para que o Senhor, o seu Deus, os abençoe em todo o trabalho das suas mãos” (Deuteronômio 14.28-29).
“Quando fizerem a colheita da sua terra, não colham até as extremidades da sua lavoura, nem ajuntem as espigas caídas da sua colheita. Deixem-nas para o necessitado e para o estrangeiro. Eu sou o Senhor, o Deus de vocês” (Levítico 23.22). “Se alguém do seu povo empobrecer e não puder sustentar-se, ajudem-no como se faz ao estrangeiro e ao residente temporário, para que possa continuar a viver entre vocês” (Levítico 25.35). “Se houver algum israelita pobre, … não endureçam o coração, nem fechem a mão para com o seu irmão pobre. Ao contrário, tenham mão aberta e emprestem-lhe liberalmente o que ele precisar” (Deuteronômio 15.7-8).
“Não se aproveitem do pobre e necessitado, seja ele um irmão israelita ou um estrangeiro que viva numa das suas cidades. Paguem-lhe o seu salário diariamente, antes do por do sol, pois ele é necessitado e depende disso. Se não, ele poderá clamar ao Senhor contra você, e você será culpado de pecado” (Deuteronômio 24.14-15).
As viúvas Noemi e Rute se beneficiaram da fidelidade de um rico proprietário em Belém, chamado Boaz (Rute 2.2-9). Provérbios 14.31 diz: “Oprimir o pobre é ultrajar o seu Criador, mas tratar com bondade o necessitado é honrar a Deus.”
No quinquagésimo ano, o ano do Jubileu, os israelitas que perderam suas terras, que era sua herança do Senhor, por causa da pobreza ou porque as venderam para pagar uma dívida, tiveram suas dívidas canceladas. Os que se venderam à escravidão para pagar uma dívida receberam sua liberdade e puderam retornar à suas terras (Levítico 25.13; 28 e 54). Deus considerou a terra dele e o povo inquilino, como se fosse imigrante e estrangeiro (Levítico 25.23). Mesmo sendo vendidos em servidão, eles não podiam ser feitos como escravos, mas como trabalhadores contratados (Levítico 25.40).
Nos dias de Isaías, o povo se queixou por que Deus não os estava auxiliando, apesar de oferecerem sacrifícios e de jejuarem com orações. A resposta de Deus a essa queixa foi: “No dia do seu jejum vocês fazem o que é do agrado de vocês, e exploram os seus empregados” (Isaías 58.3). Ele continuou:
“O jejum que desejo não é este: soltar as correntes da injustiça, desatar as cordas do jugo, pôr em liberdade os oprimidos e romper todo jugo? 7 Não é partilhar sua comida com o faminto, abrigar o pobre desamparado, vestir o nu que você encontrou, e não recusar ajuda ao próximo? 8 Aí sim, a sua luz irromperá como a alvorada, e prontamente surgirá a sua cura; a sua retidão irá adiante de você, e a glória do Senhor estará na sua retaguarda. 9 Aí sim, você clamará ao Senhor, e ele responderá; você gritará por socorro, e ele dirá: Aqui estou” (Isaías 58.6-7 e 9a).
Salmo 41.1 assegura aos que demonstram misericórdia, “Bem-aventurados os que consideram os fracos; o Senhor os livra em tempos de angústia.”Em sua oração na dedicação do templo, Salomão pediu:
“Quanto ao estrangeiro, que não pertence a Israel, o teu povo, e que veio de uma terra distante por causa do teu grande nome, da tua mão poderosa e do teu braço forte; quando ele vier e orar voltado para este templo, 33 ouve dos céus, lugar da tua habitação, e atende o pedido do estrangeiro, a fim de que todos os povos da terra conheçam o teu nome e te temam, como faz Israel, o teu povo, e saibam que este templo que construí traz o teu nome” (2 Crônicas 6.32-33).
Embora Salomão tenha recebido a rainha de Sabá e a tratado com hospitalidade real, ele não tratou os cananeus que ainda viviam na terra com o mesmo respeito. Ele os recrutou para trabalho forçado, uma prática que continuou até a época do cativeiro (2 Crônicas 8.7-8). Ele não apenas oprimiu os cananeus, mas também aproveitou seus companheiros israelitas. Para construir o templo, e provavelmente seus outros projetos, incluindo palácios e cidades, ele arregimentou 30.000 trabalhadores de todo o Israel e os enviou em turnos de dez mil por mês para trabalhar no Líbano. Ele tinha 70.000 transportadores e 80.000 pedreiros nas colinas. Adonirão chefiava o trabalho e os capatazes que, por sua vez, supervisionaram o trabalho forçado (1 Reis 5.13-16). Depois que Salomão morreu, as tribos do norte, sob a liderança de Jeroboão, pediram que seu filho Roboão “aliviasse o trabalho duro e o jugo pesado” que sofreram durante o reinado de seu pai.
As tribos do norte foram arrancadas fora da linhagem de Davi porque Salomão se casou com esposas estrangeiras e adorou seus ídolos (1 Reis 11.1-5 e 11). Deus usou a agitação social provocada pela opressão das tribos, fora da tribo de Judá, para provocar isso.
Numa era de aparente prosperidade, no reinado de Jeroboão II de Israel, Amós falou contra a opressão dos pobres:
“Por três transgressões de Israel, e ainda mais por quatro, não anularei o castigo. Vendem por prata o justo, e por um par de sandálias o pobre. Pisam a cabeça dos necessitados como pisam o pó da terra, e negam justiça ao oprimido” (Amós 2.6-7).
Até as mulheres ricas e privilegiadas foram repreendidas: “Ouçam esta palavra, vocês, vacas de Basã que estão no monte de Samaria, vocês, que oprimem os pobres e esmagam os necessitados e dizem aos senhores deles: “Tragam bebidas e vamos beber!” (Amós 4.1). Ele advertiu que chegaria o dia em que elas seriam levadas (para cativeiro) com anzóis (Amós 4.2). O Senhor continua sua acusação contra Israel:
“Vocês oprimem o pobre e o forçam a dar-lhes o trigo. Por isso, embora vocês tenham construído mansões de pedra, nelas não morarão; embora tenham plantado vinhas verdejantes, não beberão do seu vinho” (Amós 5.11).
Ele implorou: “Busquem o bem, não o mal, para que tenham viva” (Amós 5.14). “Em vez disso, corra a retidão como um rio, a justiça como um ribeiro perene!” (Amós 5.24).
No período perigoso antes da queda de Jerusalém, o rei Zedequias fez um pacto com o povo da cidade para proclamar o Jubileu, liberdade para os escravos. Porém o rei e os ricos da cidade mudaram de ideia e forçaram os pobres de volta à escravidão. A palavra do Senhor veio a Jeremias: “Portanto, assim diz o Senhor: ‘Vocês não me obedeceram; não proclamaram libertação cada um para o seu compatriota e para o seu próximo. Por isso, eu agora proclamo libertação para vocês’, diz o Senhor, ‘pela espada, pela peste e pela fome’” (Jeremias 34.17). Em poucos anos, a riqueza, o poder e o privilégio dos ricos foram totalmente destruídos pelas forças sitiantes de Nabucodonosor.
Quando Davi estava enfrentando um grande perigo, possivelmente quando estava fugindo da ameaça mortal do rei Saul e, mais tarde, de seu próprio filho Absalão, Davi se humilhou como um pobre quando fez seu apelo a Deus: “Quanto a mim, sou pobre e necessitado, mas o Senhor preocupa-se comigo. Tu és o meu socorro e o meu libertador; meu Deus, não te demores!” (Salmo 40.17). Mesmo como rei no auge do sucesso e do poder, ele entendeu que Deus tomava o lado dos pobres. Natã veio a ele com uma parábola de um homem rico que roubou o único cordeirinho de um homem pobre. Ao tomar Bate-Seba e matar seu marido, David estava pisando nos direitos dos pobres. Condenado por seu pecado, sem inocência para se apoiar, e completamente quebrantado, Davi implorou a Deus por perdão (Salmo 51) e o Senhor lhe respondeu graciosamente (Salmo 32). Ele sabia em seu coração que Deus era o defensor dos fracos e dos pobres.
Quando falamos sobre o cuidado especial de Deus pelos pobres no Antigo Testamento, precisamos nos lembrar de que Deus também chama os pobres à responsabilidade moral. Eles não são meramente vítimas de abuso ou negligência. Deus chama todos, ricos e pobres, para serem santos e justos. Na lei de Israel, Deus se revela justo. Ele diz ao seu povo: “Não cometam injustiça num julgamento; não favoreçam os pobres, nem procurem agradar os grandes, mas julguem o seu próximo com justiça” (Levítico 19.15). Esta é uma advertência para todos nós, envolvidos no ministério aos pobres que não devemos desculpar o pecado deles. Sabemos que circunstâncias podem influenciar uma pessoa a se envolver em atividade criminosa. Uma criança pode crescer sem a presença, amor e orientação de seu pai, mas isso não desculpa sua desobediência e desrespeito à mãe. “Quem despreza a disciplina cai na pobreza e na vergonha, mas quem acolhe a repreensão recebe tratamento honroso” (Provérbios 13.18).
Muitos pobres estão sofrendo as consequências de sua própria loucura. Preguiça e negligência levarão um indivíduo à pobreza (Provérbios 6.9-11; 10.4-5). “Todo trabalho árduo traz proveito, mas o só falar leva à pobreza” (Provérbios 14.23). Além disso, o continuar numa vida de pecado não recebe a bênção de Deus. “Quem esconde os seus pecados não prospera, mas quem os confessa e os abandona encontra misericórdia. Como é feliz o homem constante no temor do Senhor! Mas quem endurece o coração cairá na desgraça” (Provérbios 28.13-14).
Por outro lado, se tivermos escapado das consequências de nosso pecado, nunca devemos nos gabar do desaventura de outros, para que não soframos o castigo de Deus em nossa vida (Provérbios 17.5). Uma vez eu ri quando meu irmão foi punido. O que minha mãe fez? Ela me pegou pelo braço e me puniu também. Israel foi punido por sua idolatria, mas as nações que a desprezavam e se vangloriavam dela também entraram em condenação.
Contudo, Deus é misericordioso com aqueles a quem humilhou. Ele permitiu que sofressem as consequências da sua loucura; mas, ele salva e redime os que o invocam em seus problemas (Salmo 107.6; 13; 19; 28 e 41). Podemos pensar: “Eles estão recebendo o que merecem”, mas devemos ter cuidado para não nos orgulhar e então sofrer o mesmo castigo. Precisamos nos humilhar diante de Deus e imitar seus caminhos de perdão e compaixão pelos outros.
